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Coluna do Samuel

E AÍ, QUEM VAI PAGAR O PATO?

Se Paulo Skaf, que representa um punhado de industriais, diz que não vai pagar o pato, quem vai então?

As manifestações realizadas no Brasil contra o governo Dilma, desde o dia 17 de outubro de 2015, contam com a presença de um gigantesco pato. Tal pato carrega consigo uma campanha, lançada após encontro entre lideranças da FIESP, contra o aumento de impostos e a volta de CPMF, alegando que não será o povo brasileiro quem pagará o pato pela corrupção do PT.


A Contribuição Provisória sobre Movimentações Financeiras (CPMF) foi um imposto que existiu até 2007 para cobrir gastos do governo federal com projetos de saúde. O governo Dilma propôs cobrar uma alíquota de 0,2% sobre todas as transações bancárias de pessoas físicas e empresas. Por exemplo, se você retirasse R$ 100 mil do banco, você pagaria R$ 200 de imposto pela movimentação financeira. Ao comprar um carro no valor de R$ 30 mil à vista, o contribuinte vai desembolsar uma contribuição de R$ 60. Ao transferir R$ 1 mil para a conta de outra pessoa, você pagaria CPMF de R$ 2. Entretanto, existe um ponto a se ressaltar: as operações financeiras que o povão e a elite realizam têm valores absolutos muito distintos. Logo, apesar de a porcentagem ser a mesma para quaisquer volumes de transação financeira, o valor arrecadado pelo imposto sobre as grandes transações financeiras do andar de cima vai ser muito maior que aquele arrecadado sobre o andar de baixo.


Agora que sabemos que a CPMF afetaria tanto as pessoas físicas quanto as empresas, você acha que a FIESP (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo) defende os direitos dos trabalhadores ou dos empresários? Aquele trabalhador que acorda todo dia cedo e chega em casa a noite ou o empresário? O trabalhador que ganha um salário mal dá para pagar as contas ou do milionário?

A FIESP desde sempre representou os direitos dos empresários. A federação apoiou o golpe que mergulhou o país em 21 anos de ditadura militar. A mesma pagou para golpistas derrubarem o presidente João Goulart, foi contra o aumento de 300% do salário mínimo em 1952 e mandou a ditadura reprimir violentamente os trabalhadores em greve em Osasco, dando início ao clima político que desembocaria no AI-5. Hoje ela está aliada ao presidente afastado da Câmara, Eduardo Cunha, que responde a diversos processos de corrupção e tem 13 contas na Suíça para guardar o seu dinheiro corrupto (que são conhecidas). Também não custa lembrar que foi a FIESP quem pagou um dos maiores centros de repressão e tortura do país – a Operação Bandeirantes, a Oban.


A FIESP vai apoiar Michel Temer (PMDB) nas mudança das leis trabalhistas, em prejuízo dos assalariados; revogar a política de valorização do salário mínimo; implantar a terceirização irrestrita da mão-de-obra (como defende o Presidente da FIESP e político pelo PMDB Paulo Skaf); entregar as reservas de petróleo do pré-sal às empresas transnacionais (como defende o senador José Serra); privatizar o Banco do Brasil e a Caixa Econômica Federal; introduzir o ensino pago nas universidades federais, como primeiro passo para a sua privatização; reprimir os movimentos sociais; acabar com o Programa Mais Médicos; dar sinal verde ao agronegócio para se apropriar das terras indígenas; eliminar a política externa independente. É isso, muito mais do que o mandato da presidenta Dilma ou o futuro político de Lula, o que está em jogo com esse golpe.


Diante do agravamento da crise capitalista, a ofensiva dos interesses dos agentes do mercado busca fazer com que os trabalhadores "paguem o pato". O PMDB, partido que possui maioria no congresso, é o atual ventríloquo dessa burguesia. A "Ponte para o Futuro" é um manual fajuto do neoliberalismo, que visa criar na mente do cidadão comum a ideia da necessidade de um "sacrifício à nação". "Sacrifício" que, na verdade, significa mais cortes em setores como educação, saúde e assistência social.



Além de toda essa baboseira sobre a “ponte”e “sacrifícios”, o novo ministro da Fazenda, Henrique Meirelles (PSD), afirmou, na manhã do dia 13/5, que o governo do presidente interino Michel Temer (PMDB) pode, sim, lançar mão da CPMF para auxiliar no equilíbrio fiscal. A declaração foi feita durante coletiva de imprensa, quando o goiano garantiu que o objetivo maior, contudo, é diminuir a tributação brasileira, “que já é elevada demais”.


Segundo ele, a economia precisa voltar a crescer de forma sustentável, portanto, é importante que a meta seja a diminuição dos tributos para a população. Mas, em um primeiro momento, ou “de forma temporária”, o governo pode manter a proposta apresentada pela presidente afastada, Dilma Rousseff (PT), de recriar a Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF) — proposta que foi veementemente rejeitada por congressistas e até governadores.


Meirelles assegurou, ainda, que a nova equipe econômica está preparada para tomar “as medidas necessárias” para fazer o País voltar a crescer.


Mas não era contra isso que o pato estava na rua, que milhões de brasileiros estavam protestando, que Temer ia salvar o Brasil com uma solução mirabolante jamais antes pensada? Cade o pato agora? Até o pato era parte do Golpe?


Como disse Marina Silva em um raro momento de lucidez:


Então é o trabalhador que vai pagar o pato?


O pato, na verdade, já está sendo pago pelos trabalhadores.


Nesse gráfico da própria FIESP se vê que a produtividade do trabalho seguiu mais ou menos estável no período analisado, assim como o rendimento médio em reais. Porém houve uma forte queda no rendimento médio do trabalhador em dólares, ficando abaixo da produtividade desde o início de 2015:


A queda do valor do real em relação ao dólar (desvalorização cambial) significa um rebaixamento do custo da força de trabalho em dólares, o que faz com que as empresas exportadoras, como as grandes montadoras do ABC, tenham um produto mais competitivo lá fora – a competitividade nas exportações é uma forte bandeira da FIESP. Na região do ABC, duros ataques estão anunciados para os próximos meses, com a possível demissão de 1200 que estão em lay-off até o meio do ano na Volks de São Bernardo, ou os 2300 da GM de São Caetano.

Outro efeito dessa desvalorização cambial é sobre os salários. Produtos importados, insumos, tem peso significativo no conjunto da economia brasileira. O real desvalorizado gera um alto custo na importação, que por sua vez gera um efeito em cadeia de aumento de preços em diversos produtos, alimentando a inflação. Com os salários sendo ajustados pouco acima ou mesmo abaixo da inflação, a diferença entre o aumento dos preços e o (não) aumento dos salários, não desaparece no ar, é diretamente embolsada pelos empresários – os trabalhadores estão gastando mais do seu salários com os produtos mais caros.

Nas palavras do próprio Skaf, “a desvalorização do real frente ao dólar foi o único fator positivo para o setor neste ano e, se o câmbio se mantiver na faixa de R$ 3,50, as fabricantes podem ser beneficiadas”. Em outro gráfico, no mesmo material, vemos como o custo unitário do trabalho em dólares, que é calculado como o diferencial entre a variação real média e a variação da produtividade, caiu significativamente nos últimos anos. Isso ajuda a ver a intensidade do que dissemos acima, pois enquanto o trabalhador está produzindo tanto quanto antes (ou mais, na verdade, tendo em vista as crescentes demissões), está custando mais barato e está gastando mais, seu salário está valendo menos. A busca da FIESP por competitividade implica numa dura deterioração das condições de vida dos trabalhadores. Isso é o pato e quem está pagando por ele.

Qual empregado não se sente confortável comendo com a mão esquerda e operando máquina com a mão direita? Qual trabalhador não quer negociariar seus direitos com o patrão? Afinal “tem que ver se ele quer”.



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