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Coluna do Samuel

Afetividade


Tanta cobrança tenho de insinua-la, já que a demonstração parece não ser suficiente. Mas por palavras, pra mim nunca teve importância, chegando à incomodação quando feito,juntamente com afirmações quando não o faço.

Eu não me importo, não ligo, não amo devidamente, não sinto saudades. Sou indiferente. E amor devido é aquele falado.

Ao crescermos, a partir da vivência em conjunto, adotamos e aprendemos os comportamentos vindo daqueles em que nos espelhamos que, no meu caso, são os meus pais. É fato que o comportamento e pensamento prevalece quando cultivado e a ausência da demonstração por palavras de tal afetividade torna-se um exemplo.

Em meus 16 anos, não me recordo de momento algum de escutar a frase (essencial para muitos) "eu te amo" vindo de meu pai. Meus irmãos, muito menos. A minha mãe falava, mas foi parando ao perceber que ninguém fazia o mesmo e como dito, comportamentos cultivados são os que prevalecem.

Como criança, ouvia sempre um "beijos, te amo" em despedidas entre minhas amigas e mães, um amigo dizendo a outro que o amava por brincar com ele, um "que saudade" vindo daquele que se ausentava na escola. Tudo isso me incomodava, as falas de afeto não fazia sentido, era muito superficial, era errado e acho que era porque eu não o tinha, não achando normal, mas que queria ter, queria que minha família falasse que me amava, que sentiam saudade e ver os outros tendo isso me deixava frustrada.

Eu te amo.

É tamanha representatividade que me sinto pressionada quando alguém o fala pra mim, com a obrigação de dizer o mesmo. É claro que eu falo, aprendi a falar indo no embalo dos que falavam constantemente, mas a superficialidade nunca deixou de existir nessa minha fala. Falar para os meus irmãos, nunca. Falar é o problema, causa desconforto.

Pode ser incompreensível e exagero o que umas simples frases podem causar e é mesmo difícil de explicar pra quem as acham essenciais e normais, eu até entendo.


Mas pra mim não é.

E não quer dizer que eu não ame. Muito menos que a minha família não se ama. Pra mim o amor é sentido, vivido e real. É profundo e eu sei amar, só não consigo dize-lo, porque ele vai além da fala. Pra mim o amor é chegar em casa e assistir o episódio novo de uma serie que meu irmão baixou pra nós vermos juntos,é meu outro irmão querer que eu o visite em sua casa, porque sente a minha falta, é me mostrar artes, livros, músicas, séries. É saber que eles sempre vão me defender e apoiar. A gente sabe que se ama, então não precisamos dize-lo. Eles mesmos me disseram isso.

Eu me acostumei.

Mas isso não vale a insinuação de falta de sensibilidade e compaixão, a indiferença. Pelo contrário, sou muito sensível e sentimental, só que explicar esse bloqueio e normalidade em não falar é difícil. Afinal, é só dizer, as pessoas se contentam com um a superficialidade de um "eu te amo", mas eu não consigo fazê-lo. Sei que as vezes, em meio a situações, é necessário demostrar pela fala e é nessas que digo com maior sinceridade que tenho.

Mas constantemente, como numa simples despedida... Não consigo.

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